terça-feira, 25 de maio de 2010

Plenitude e ternura

Antes, muito antes, nada me parecia alcançável. Ouvi senti andei esperei. Não sabia, não conhecia por não querer conhecer. Assim, me encapava e me deixava impenetrável. Nada entrava em mim. Eu era um corpo só, um pequeno pedaço perdido de amor doce, já quase amargo, amargurado pela solidão latente quente úmida. Até que aconteceu, num rompante do mais completo nada – naquele breu, vazio e sem cor -, meus olhos se cansaram! E se abriram sozinhos, se decidiram sozinhos: fui até lá e explodi. Me deixei tocar me deixei sentir me deixei ser penetrada, corrompida, aberta. Pelo mundo, pelas coisas, pelas pequenas e grandes letras. E meu papel se preencheu todo, todo cheio de exclamações (elas são lindas). Estava no lugar certo. Gritei a minha maior voz. E a partir de então, tudo me quer, tudo me ganha e me conquista. A vida me capta, me namora, me nina (eu peço, a cada gota que cai: me nina menina). Agora sou o mosaico de tudo que me compõe. Sou não hum’Ana (ser qualquer uma das Anas é pouco), sou feita dos dentes brancos do senhor na sarjeta, dos fios ruivos que saem da cabeça da criança no metrô, da luz que reflete no vidro (em todos os vidros), de tudo mais que me enche do mais tênue prazer... e sou feita da água. De quando ela me bate, me cura, se escorre... e morre. Quero tudo em mim. O que antes era eu, agora somos eu e todas as coisas: nós.


Texto feito pra faculdade

Um comentário:

Marília Monteiro disse...

Fe! Adorei esse texto, é tão você :)
reconheci umas palavras 'à la' Clarice Lispector (quente, latente, crua, água..). Anda lendo algo do tipo? Hoho!
Saudade de você!